Imagens
visuais evocativas e um forte elenco reestruturaram a infame lesão como uma
heroína matando o patriarcado.
O
mundo sabe exatamente uma coisa sobre Lizzie Borden: Ela golpeou seus pais com
um machado. Muitas vezes. Não exatamente 40 golpes cada um como na rima
infantil, mas o bastante para transformar o rosto de seu pai em mingau, um
crime tão horrendo, que os jornais de 1892 escreveram que só poderia ter sido
cometido por “alguém insano ou uma pessoa sã que tem o coração tão preto de
ódio como o próprio inferno.” O diretor Craig William Macneill, de Lizzie, tem
outra teoria. Ele reimagina a assassina (Chloe Sevigny) como uma vítima
poderosa que literalmente mata o patriarcado. É uma história simples feita para
despertar os corações modernos, e as performances e cinematografia são tão
boas, que o filme quase consegue isso. Mas após uma sólida hora de tensão,
Macneill não pode resistir a nos atingir com um replay extenso do ataque, o
que, ironicamente, é a sequência mais tediosa do conto miserável de Borden.
Primeiramente,
é importante saber que os Borden eram ricos, por isso que sabemos o nome de
Lizzie. Ela e sua irmã mais velha Emma (Kim Dickens), uma presença invisível,
eram os Irmãos Menendez da Era Dourada, duas irmãs esperando para receber uma
fortuna. (Embora aos 22, bem mais nova do que a interpretação de Macneill, as
perspectivas de casamento de Lizzie não teriam sido tão terríveis.) Ainda
assim, a filha de um homem rico na Era Dourada tinha menos opções do que uma
herdeira hoje em dia – ao invés de desenhar uma linha de sapatos, Lizzie estava
presa em casa preocupada que seu pai, Andrew (um franzido Jamey Sheridan),
daria sua fortuna para seu irmão John (Denis O’Hare), imaginando que as mulheres
não aguentariam o poder.
Macneill
e o roteirista Bryce Kass interpretam seus papéis corajosamente. Andrew não é
apenas um pão duro, o que ele era (os Borden eram famosos no local por se
recusarem a se atualizarem para luzes elétricas); ele também é um estuprador
sexista e homofóbico. E Lizzie é uma lésbica apaixonada por sua empregada
Bridget (Kristen Stewart), uma imigrante irlandesa que entra no filme com um
vestido marrom arrumado parecendo um passarinho indefeso. Ela até possui algumas
penas pequenas em seu chapéu.
Sevigny
e Stewart possuem o maxilar forte e pontudos de pessoas que não são tão frágeis
como parecem. No começo, Lizzie tem uma boca feroz, retrucando para a garota má
que a provoca por ainda usar luz de vela, “Você é uma Edison? Lizzie avança
após a primeira meia hora e as duas amantes eventualmente ficam quase mudas, o
que reforça as ideias do filme sobre passividade feminina, mas também choca com
a garota teimosa que conhecemos. A empregada de Stewart é mais direta e
prática, o tipo de personagem que se enche de vida apenas com o olhar.
Diferente de Lizzie, ela não oferece esperanças para o futuro. No dia do
assassinato, ela testemunhou que estava do lado de fora limpando janelas – o
que é verdade, de acordo com o testemunho gravado de Bridget, e uma metáfora
perfeita para os empregados que enxergam mais do que as pessoas de dentro.
Mas
as duas estão presas nessa casa de três andaram, que é sem ar e silenciosa,
exceto pelas ondas de música psicologicamente desenfreadas – violinos maníacos,
teclas de piano pulsantes que se tornam grilos – que Macneill usa para nos
tirar de uma cena terrível para a outra. Por outro lado, ele mantém as coisas
silenciosas, exceto pelos passos altos e rangidos que fazem as paredes
parecerem vivas. Durante as noites que Andrew vai nas pontas dos pés até o
quarto de Bridget, a câmera permanece em seu rosto agoniante, porém conformado,
quando ela escuta-o se aproximar. Depois, quando Andrew volta para sua esposa
(Fiona Shaw), a madrasta que Lizzie odeia, a câmera dá a ela o mesmo close-up
simpático. Nenhuma mulher aqui está feliz.
A
cinematografia de Noah Greenburg é deslumbrante. Ele enquadra suas atrizes, as
deixando em foco entre janelas e cercas para fazer parecer que elas são
prisioneiras. Nessa escuridão, elas raramente passarem livres. Mesmo no
primeiro beijo de Lizzie e Bridget no celeiro e seus rostos são iluminados com
a luz do sol, a câmera se afasta da alegria para nos lembrar que elas ainda
estão presas no domínio de Andrew. Na melhor das hipóteses, elas podem usar essa
casa como um instrumento, escondendo bilhetes uma para a outra assim que Lizzie
ensina Bridget a ler.
O
julgamento de Lizzie dominou os papéis por seis meses, e incluiu partes
atraentes como a chocante falta de sangue nos dois corpos, quase como se eles não
tivessem mesmo sangue em suas veias. O filme mostra por alto o crime,
repetidamente, com poucas cenas além de uma onde Sevigny está nua e tremendo. O
terceiro ato é uma bobagem, e meramente dá dicas de ideias que deveriam
explorar. Os jornalistas chamaram a menina de fria e sem sentimentos. Outro
jornal que Macneill não cita escreveu que “durante sua prisão, ela agiu com
maravilhosa calma.” Talvez, na realidade, ela era uma sociopata. Ainda assim, o
filme enche sua vida com tanta emoção que parece pronto para argumentar com os
jornalistas homens que não tentaram empatizar. Para eles, talvez o ponto de
vista de uma mulher era simplesmente irreconhecível, e se esse é o ponto de
Macneill, ele poderia ter feito ser mais forte.
Ao
invés disso, o que prevalece é apenas violência de dois gêneros na guerra,
literalmente por sua própria sobrevivência. Quando um detetive pergunta para
Lizzie se seu pai tinha algum inimigo, ela responde, “Isso é a América, senhor.
Qualquer homem com um pulso tem inimigos.” É uma armadilha para uma hashtag –
certamente, nem todos os homens da Era Dourada eram estupradores abusivos.
Ainda assim, Lizzie não desafia o público a discordar.
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