Nas fronteiras de um "império" não especificado, há um posto avançado com vista para o deserto, em cujas alturas vive uma população bárbara: a guarnição da fortaleza monitora a situação, mas do perigo real não há vestígios, e a vida na pequena cidade continua silenciosamente, esperando uma invasão que talvez nunca chegue. Se essas premissas lembram alguma coisa, significa que você fez sua lição de casa: o romance À Espera dos Bárbaros de J.M. Coetzee claramente se inspira em O Deserto dos Tártaros, de Dino Buzzati, enquanto se concentra em temas diferentes dos últimos.
Bem, Waiting for the Barbarians transpõe o livro do escritor sul-africano - também autor do roteiro - pelos olhos de Ciro Guerra, um diretor colombiano que foi capaz de contar às comunidades nativas da América do Sul em filmes como El abrazo de la serpiente e Oro verde. Mark Rylance interpreta o magistrado do posto avançado, um homem pacífico que promove a convivência com os bárbaros; mas quando o coronel Joll (Johnny Depp) é contratado para relatar a atividade de estrangeiros na fronteira, a situação muda: Joll de fato tortura vários bárbaros e cega parcialmente uma mulher que o magistrado leva a sério. A rebelião desta última, que quer levar a garota de volta ao seu povo, terá consequências muito graves.
É curioso que, ao transpor o livro de Coetzee, Ciro Guerra adotou o mesmo registro escolhido por Valerio Zurlini para Il deserto dei tartari: silêncios, tempos dilatados e disparos em campo total para mostrar a desolação que circunda o posto avançado. Nesse caso, no entanto, Waiting for the Barbarians falha em explorar seu potencial expressivo, e os momentos mais válidos são as comparações dialógicas entre o magistrado Joll e Mandel, o policial interpretado por Robert Pattinson. É nessas cenas que o conflito cultural entre os personagens surge, além disso, bem coagulado nos rostos dos atores: se as performances medidas de Depp e Pattinson comunicam a rigidez de seus colegas, a doce e maleável imitação de Mark Rylance personifica as habilidades empáticas do magistrado, a sua vontade de entender "o outro".
De fato, o coração de Esperando os Bárbaros é precisamente este: o conflito extremamente contemporâneo entre aceitação e discriminação, amor e ódio, confiança e desconfiança. O tema ecoa nas crônicas de nossos dias, mas Guerra e Coetzee fazem desse "império" também um reflexo das políticas expansionistas americanas, que acabam criando seus próprios inimigos através de uma nova forma de colonialismo. A agressão gera mais violência, e o círculo vicioso se alimenta.
No entanto, a habilidade dos atores e a atualidade dos temas não são suficientes para evitar a planicidade do filme, que se arrasta cansadamente até o epílogo mais óbvio, consciente - sim - da obra-prima de Buzzati.
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