Atenção: a matéria abaixo contém spoiler!
Se você assistiu ao trailer de Spencer, com Kristen Stewart interpretando a Princesa Diana, você provavelmente pegou um vislumbre de uma personagem interpretada por Sally Hawkins (A Forma da Água, Blue Jasmine). Sua atenção provavelmente estava tão fixada em Stewart completamente caracterizada de Diana (A peruca! As pérolas! O figurino extraordinário!) e os outros membros da família real (a rainha! Príncipe Charles! Príncipe Harry! Os corgis!) que você, assim como eu, não parou para pensar: “O que uma atriz duas vezes indicada ao Oscar está fazendo no que parece ser um papel pequeno de empregada?” Se tivesse, teria imaginado corretamente que a personagem de Hawkins interpreta um papel maior em Spencer do que o trailer sugere.
No filme, um psicodrama focado no fim de semana de Natal de Diana em Sandringham em 1991, ela está em um estado vulnerável. Seu casamento está irremediavelmente fragmentado. Ela entende que a família real a considera um “problema”. Diana está sofrendo de bulimia e surtos de paranoia, ambos aparentemente intensificados pelas pressões de Sandringham, sua procissão de banquetes em horário militar, trocas de roupas e protocolos reais restritos. Mais do que nunca, no entanto, ela está sozinha.
Sozinha, exceto por Maggie, uma dama de companhia inicialmente designada a vestir Diana durante o fim de semana de Natal. Diana considera Maggie mais como uma amiga, aliada, sistema de apoio do que funcionária e a trata como de acordo. Perto do final do filme, quando a princesa está particularmente para baixo, somente Maggie é capaz de animá-la, confidenciando durante um passeio na praia que está apaixonada por Diana. O relacionamento não é consumado, mas a confissão dá para Diana o empurrão que precisa para se recuperar da escuridão de Sandringham.
Quando me juntei ao roteirista Steven Knight através do Zoom, perguntei para ele diretamente: “Maggie é baseada em uma pessoa real?”
Ele sorriu e disse: “Eu não posso comentar nisso porque, o problema é: assim que você for específico, se torna história.” Para pesquisar para o filme, Knight disse que falou diretamente com membros da equipe de Sandringham e jurou proteger suas identidades. “O que quero fazer é apenas dizer que as coisas mais estranhas são verdades e que a informação veio de pessoas que conheciam… Apenas acho que é interessante e divertido. Tem raízes em coisas, então possui essa autoridade.”
Stewart, que também pesquisou cuidadosamente antes de filmar, disse em uma entrevista diferente ao lado do diretor Pablo Larraín que ela estava desesperada para saber com quem ele falou.
“Eu só me encontrei com o Steven uma vez e foi no Festival de Londres. Ele disse: “Eu falei com umas pessoas, mas não posso nem revelar os nomes,” porque elas estavam se abrindo para ele discretamente. Eu queria tanto arrastá-lo para fora do palco e perguntar: “Quem?” Eu nunca tive a chance.”
Sobre escrever a história, Knight disse: “Quando você tem um personagem tão simpático como a que Sally está interpretando, suponho que queira levar até o limite. O quão longe isso vai? Deixando de lado o que realmente aconteceu como fonte, também é ótimo ter alguém expressando empatia intensa por uma pessoa do nível de baixo.”
Na vida real, Diana se sentia desconfortável no nível de cima em Sandringham e ocasionalmente procurava refúgio no nível de baixo, onde conversava com funcionários e algumas vezes fazia um lanchinho, de acordo com Stewart.
“Ela ia para baixo e arrancava partes de um cordeiro e dizia: “Oh, a comida é melhor aqui. Eu realmente não gosto do que eles nos dão lá em cima,’” disse Stewart. “Ela descia e comia com as mãos. Algumas pessoas achavam a coisa mais estranha e outras achavam legal. Incomodava algumas pessoas porque isso ia contra o protocolo e outras se apaixonavam por essa ideia. Eu sei que de fato havia muitas Maggies, pessoas que ela precisava se apoiar, que ela precisava alcançar e trazer para dentro.”
Falando sobre a função da personagem de Hawkins, Larraín disse: “Ela está lá não somente para expressar seus sentimentos, mas para lembrar Diana de que ela é amada. É muito importante porque Diana é alguém que está tão triste por tantas razões. Tudo o que ela precisava era sentir amor de outros.” Diana, é claro, estava casada com a única pessoa no mundo que não parecia estar apaixonado por ela: o Príncipe Charles. “Ela sentiu o tipo mais triste de rejeição.”
A cena em que Maggie confessa para Diana é provavelmente uma das sequências mais felizes de Spencer. No entanto, de acordo com Larraín, filmar foi difícil. “Atuar naquela cena foi muito, muito difícil. Requer alguém com coragem e uma incrível quantidade de verdade, como Sally Hawkins. Quando estávamos procurando alguém para esse papel, tudo o que eu pensava era que precisávamos de uma atriz de verdade, uma pessoa incrível para trazer, não só a personagem, mas basicamente toda a humanidade, fragilidade da verdade e estranheza. Estava tudo lá.”
Stewart sentiu empatia por Diana e Maggie naquele momento.
“A pior coisa é quando jogam muita energia em você, mas não está vindo do lugar certo e você não consegue receber, então escorrega. Para ela dizer que está apaixonada e Diana começar a rir, é absurdo, engraçado e há um pouco de leveza e alívio naquele momento”, disse Stewart. “Mas, para mim, a cena é tão triste porque são pessoas se desencontrando. Ela não conseguiu sentir o impacto desse amor. Se tivesse, nós não estaríamos contando essa história.”
No momento da nossa conversa, Stewart havia visto o filme três vezes e, por causa da natureza surreal dele, desenvolveu sua própria teoria sobre Maggie.
“Ela é uma personagem interessante porque parece angelical e fantasiosa”, disse Stewart. “Quanto mais assisto ao filme, mais penso: “Essa pessoa é mesmo real?’”
Talvez ela se sinta desse jeito porque Hawkins, de acordo com Stewart, é seu próprio tipo de ser de outro mundo. “Na verdade, ela é uma alienígena. Ela me manda e-mails de fluxo de consciência… e-mails em versos. Ela está em um filme, não fez nenhuma preparação, não aparece em nenhuma estreia, mas eu recebo esses e-mails que são escritos por uma fada. Sinto que ela ainda está no personagem. Porque essa é ela, a que mais dá apoio, mas é inarticulada, estranha, hilária para caralho…” Stewart pausa para procurar pela palavra antes de achar: “Uma doida!”
Knight, pessoalmente, vê a conclusão do filme de forma mais otimista.
“O filme tem um final feliz e eu realmente queria que isso acontecesse porque acho que ela merece um”, disse o roteirista. “E é um pouco como um conto de fadas onde sempre criam um final feliz… O que espero que as pessoas tirem dele é que ela sempre foi alguém que estava procurando conciliação. Ela estava tentando unir as pessoas. Estava tentando acabar com as divisões e cruzar barreiras. Vivemos em uma época em que há tanta divisão, tantas barreiras que foram construídas, tantas coisas horríveis que me fazem pensar que foi uma oportunidade perdida. Se ela estivesse em uma posição de influência e não poder, talvez ela pudesse ter sido uma força contra toda essa porcaria que estamos vivendo no momento.”
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